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Novo CPC e a sobrevivência da exceção de incompetência relativa

Ex cuaqunque causa ad Praetorem in jus vocatus venire debet, ut hoc ipsum sciatur, an jurisdictio ejus sit[1]

Bom é dizer, um dos temas que será recorrente neste espaço é o anteprojeto do Novo Código de Processo Civil, atualmente em trâmite no Congresso Nacional, mais precisamente na Câmara dos Deputados.

Afora a magnitude do tema, diploma voltado a debelação, por assim dizer, da grande maioria de conflitos que se apresentam na arena jurisdicional, o anteprojeto é atualmente objeto de amplo debate, inclusive no twitter — tag #NovoCPC.

Como se prega aqui e acolá, o Novo CPC nasce impregnado pela ideologia da aceleração na prestação jurisdicional, objetivo mirado por sua ilustre Comissão elaboradora, o que, como sói de ser, repercutiu na sua conformação estrutural.

Verdade seja, resultado daquela diretriz, já na primeira reunião da Comissão, decidiu-se pela aglutinação na contestação de matérias antes afetas a outros invólucros (v. G. exceções, impugnações, incidentes e etc.). A contestação — por sua abrangência, melhor seria designar resposta, eis que passou a abarcar as questões alinhadas em tal título no Código vigente —, virou o continente de toda matéria de defesa, razão porque não remanesceria a exceção de incompetência relativa.

Nada obstante, mais por mérito de texto relativo à viva controvérsia sobre o decreto legislativo nº 28, de 4 de março de 2010, que tornou a partir desse ano obrigatória em alguns casos a mediação na Itália[2], constatei, no ponto, uma aporia na proposta do Novo CPC, a ser objeto de imediata atenção, sob pena de se reviver pela práxis o que a pena do legislador tenta riscar, especificamente a exceptio fori.

Ora bem, pelo anteprojeto, a incompetência relativa será articulada em preliminar da contestação (artigos 64 e 327), cujo momento procedimental de apresentação é o quinquídio posterior ao término da fase conciliatória.

Por oportuno, observe-se, o anteprojeto estatuiu no capítulo V do Título I do Livro II — Processo de Conhecimento e Cumprimento de Sentença —, estádio processual para realização de conciliação, através de conciliador ou mediador.

Portanto, verificada a aptidão da exordial e a viabilidade da pretensão (artigo 323), será designada audiência de conciliação, a cujo comparecimento estão premidas as partes pelo engendramento de verdadeiro dever processual, já que a ausência injustificada é considerada ato atentatório da justiça e sancionada com multa (artigo 323, § 6º).

Deveras, possível a qualquer das partes manifestar seu desinteresse, observado o prazo mínimo de dez (10) dias, na composição amigável, ao que se seguirá a abertura do prazo de resposta (artigo 324, § 2º), em conduta não desabonadora da justiça (artigo 323, § 5º).

Contudo, cogite-se, na hipótese de incompetência relativa — bem absoluta pela distância territorial desse país continental (o vocábulo absoluto é utilizado para vincar a questão, sem qualquer paralelo com a disciplina processual) —, em que a parte se veja impossibilitada de comparecer a audiência pela própria incompetência (distância do juízo, custos de deslocamento e etc.), a questão assume forte colorido.

Nesta hipótese, que não orça com o impossível e de fácil verificação, a parte pode ter interesse na realização da conciliação, pelo que não pretende acionar a regra do § 5º do artigo 323 do projeto. Mesmo porque, acionando esse preceptivo, teria que apresentar contestação, para depois eventualmente participar de audiência conciliatória. Esse sinceramente não parece o espírito imbuído pela Comissão no projeto ao trazer a audiência de conciliação para o umbral do processo, momento em que, presume-se, pelo pouco desdobramento processual realizado, as partes estão mais afeitas, predispostas, a composição.

Poder-se-ia projetar então que a parte se faria representar na audiência, como permite o § 8º do artigo 323. Além das dificuldades de se achar um preposto num local distante, aquela pode ter o desejo, como ocorre em regra, de participar do ato conciliatório, o que afasta, por completo, a projeção.

Noutro giro, mas ao redor do mesmo epicentro, possível apresentar imediatamente a contestação, no próprio local de domicílio (artigo 64), articulando a incompetência relativa e postulando a realização de audiência de conciliação no juízo competente. O pedido de realização da audiência de conciliação seria necessário, já que, conquanto sempre presente a possibilidade de sua realização (artigos 118, inciso IV, e 145), na estrutura processual propugnada não existe mais a audiência preliminar, razão porque nova oportunidade de conciliação somente no início da audiência de instrução e julgamento (artigo 344), acaso o feito não tenha sido interrompido anteriormente pelo julgamento da lide ou imediato da lide (artigos 340 e 341).

Novamente, como já dito, penso não ser esta a melhor solução, nem muito menos se coaduna com o objetivo da Comissão ao antecipar procedimentalmente à realização da fase de conciliação.

Por certo, na prática, a situação encontrará resposta no revival da exceção de incompetência. As partes apresentaram petição apartada sobre a incompetência relativa, quiçá com a tarja de exceção, pedindo sua declaração antes da audiência e a realização posterior da conciliação no juízo competente. Ademais, a superação encontra paralelo na disciplina do artigo 126 do projeto, relativo ao impedimento e a suspeição.

Deste modo, mantendo-se a linha alvitrada pela Comissão, penso que o projeto deveria ser alterado, estabelecendo-se novo parágrafo ao artigo 323, para que a audiência seja cancelada pela apresentação de pedido de declaração de incompetência, com a redesignação após seu julgamento positivo ou negativo.

[1] “De qualquer causa o chamado a julgamento deve acudir ao pretor, para que se saiba isto mesmo, se a jurisdição é ou não dele”.

[2] Disponível em: http://www.avvocatoandreani.it/notizie-giuridiche/visualizza.asp?mediazione-obbligatoria-sistema-di-tutela-giurisdizionale-riflessioni-sulla-costituzionalita-del-decreto-legislativo-marzo-2010-28-c5a9b4ca2f6e2d2341d03bcfd3a43933 Acesso em: 01 de abril de 2011.